LUSOS EM BAYREUTH – II

LUSOS EM BAYREUTH – II

LUSOS EM BAYREUTH – II

José Vianna da Motta (1868-1948), ou Viana da Mota, estudou no Conservatório Real de Lisboa, tendo composto a sua primeira peça musical com 5 anos de idade. Após concluir o curso no Conservatório Nacional em 1882, partiu em estudo para Berlim, mecenaticamente custeado pelo rei D. Fernando II e sua esposa, a Condessa de Edla. No verão de 1885, frequentou um estágio de piano de Liszt em Weimar e em 1887 frequentou o curso de interpretação de Hans von Bülow em Frankfurt am Main. Foi amigo próximo de Ferruccio Busoni.
Durante a sua carreira de concertista, que arrancou verdadeiramente em 1887, Vianna da Motta tornou-se num dos mais cotados pianistas dos finais do século XIX e dos primeiros anos do século XX (pelo menos até ao deflagrar da I Grande Guerra), tendo dado mais de mil concertos por todo o mundo, apesar da sua carreira ter sido essencialmente europeia.
Em 1917 regressou definitivamente a Portugal e dois anos mais tarde assumiu o cargo de director do Conservatório Nacional de Lisboa que manteve até 1938. Aí, modernizou os programas e métodos pedagógicos. Entre os seus discípulos destacam-se o pianista José Carlos Sequeira Costa e o compositor Fernando Lopes-Graça.
Parte da experiência alemã da juventude é relatada por Vianna da Motta em livros como Música e músicos alemães: Recordações, ensaios, críticas, onde surge o relato de uma viagem ao Festival de Bayreuth. Transcrevo da 2ª edição, revista e aumentada, editada em Coimbra em 1947. Ali surge um artigo intitulado “Os Festivais de Bayreuth no ano de 1906”, que fora publicado no Anuário Wagneriano, em Berlim, no ano de 1907.

“Nós vamos a Bayreuth por causa das obras, do novo estilo dramático, que só ali é cultivado, para receber impressões da maior profundeza e deixar actuar sobre nós um poder cultural incomparável. (…)
Quem tiver compreendido o pensamento de Bayreuth, será também muito cuidadoso na crítica, porque o que ali se apresenta é tão novo, que, por ser estranho pode parecer à primeira vista errado, enquanto que a sua profunda sapiência só poderá ser reconhecida depois de repetidas audições.
(…)
Antecipando desde já o resultado final, fique assente, que os festivais do anno de 1906 podem ser contados entre os mais brilhantes e mais perfeitos da história de Bayreuth. Especialmente o Tristão (sob a direcção de Felix Mottl) e a Tetralogia (alternadamente dirigida por Hans Richter e Siegfried Wagner) tiveram uma interpretação, da qual as representações anteriores apenas se aproximaram. O auge atingiu também desta vez a maravilhosa orquestra que, sobretudo sob a direcção de Mottl, foi simplesmente insuperável. A paixão, o encanto da sonoridade mantendo contudo a clareza da contextura polifónica arrebatou o auditório.
(…)
A distribuição dos papéis na Tetralogia foi, na sua maior parte, a mesma dos anos anteriores. Alguns artistas parecem, porém, ter-se desenvolvido ainda mais com o tempo. (…) Frau Gulbranson na Brünnhilde é impressionante. A pronúncia nem sempre é clara. [Nota de Viana da Mota, de 1940: Frau Gulbranson era norueguesa e nunca cantou em nenhum outro teatro senão Bayreuth e só a Brünnhilde]). Cornelius deu ao papel de Siegmund, pelo menos na plástica e na atitude o carácter heróico, mas quanto à voz faltava-lhe toda a energia.
Superior a todo o elogio é a encenação de Siegfried Wagner. Só o quadros da natureza e os efeitos da luz na Tetralogia mereciam uma monografia.”

Nunca é demais recordar: páginas escritas antes da estreia da Tetralogia em Portugal, que se deu em 1909.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *