No passado dia 28 de novembro teve lugar no Largo de São Carlos, entre as 14 e as 23 horas, um espetáculo multimédia que evocou a história e as tradições da Roménia e também recordou personalidades romenas e portuguesas que fortaleceram as ligações entre estes dois países com origem latina comum. Entre as 20h00 e as 23h00, houve mesmo a projeção do espetáculo multimédia EU-ROMANIA na fachada do Teatro Nacional de São Carlos. O Largo da nossa casa associou-se assim às comemorações do Centenário da Grande União da Roménia, promovidas pela Embaixada da Roménia e pelo Instituto Cultural Romeno em Lisboa.
A Roménia, celebrizada também pelo poderoso mito de Drácula, o Vampiro (e o vampiro é uma entidade bem operática, por sinal, recordemos Der Vampyr de Heinrich August Marschner, de 1828), não se resume obviamente a esses traços sanguinários. Em ópera, então, é uma nação com relevante importância.
A segunda metade do século XVIII parece ter sido a época em que arrancou a aventura lírica naquele país, com a chegada de companhias italianas, francesas e alemãs de ópera. O repertório nos últimos três decénios desta centúria foi essencialmente formado por títulos de Sacchini, Paesiello, Cimarosa, Salieri, Grétry, Dittersdorf e Mozart (de quem foram apresentadas as óperas O Rapto do Serralho em 1791 e A Flauta Mágica em 1796).
Na primeira metade do século XIX começaram também a chegar à Roménia agrupamentos chegados dos Balcãs e da Rússia, que se apresentaram em várias cidades do país. Durante este período, como sucedia em toda a Europa, dominaram os nomes de Cherubini, Méhul, Rossini, Donizetti, Bellini, Auber ou Weber. Em 1821, a triunfal digressão a Brasov e a Bucareste da Companhia de Angelica Catalani (a grande cantora louvada por Stendhall, divulgadora ímpar da obra de Marcos Portugal e estrela absoluta em São Carlos!) ajudou, pelas paixões que despertou, ao estabelecimento do primeiro teatro lírico permanente no país, em Bucareste, no ano de 1843. Na segunda metade do século do Romantismo inauguraram-se outros teatros (em Bucareste e em Iesi) e nesta época entraram em força no repertório dos palcos romenos as óperas de Verdi, Meyerbeer, Lortzing, Gounod, Bizet, Smetana, Mascagni ou Puccini. É neste período que as óperas começam também a ser apresentadas em tradução romena – seguindo uma tendência que se manifestava em Itália, em França, em Inglaterra e na Alemanha. A primeira ópera traduzida e cantada em romeno foi a Lucia di Lammermoor de Donizetti no ano de 1885.
É nesta época também que começam a surgir os intérpretes canoros romenos de renome mundial, como Elena Theodorini ou Hariclea Darclée. Ambas se apresentaram em São Carlos inúmeras vezes e a Darclée teve mesmo uma fogosa aventura amorosa com o compositor brasileiro Carlos Gomes – não será por isso de estranhar que tivesse sabido certas palavras em português!
A primeira metade do século XX assistiu ao surgimento de companhias privadas que apresentaram temporadas em várias cidades, com a ajuda estatal. Surgiram os compositores romenos Cuclin, Dragoi, Nottara, Zirra, Constantinescu, Bretan e alguns artistas desta nacionalidade começaram mesmo a ter uma projeção mundial extraordinária: George Enescu, Joel Perlea, Viorica Ursuleac (a criadora mundial das óperas de Richard Strauss Arabella, Capriccio e Friedenstag), Maria Cebotari.
Na segunda metade do século passado entraram também em evidência compositores romenos como Gheorghe Dimitrescu, Pascal Bentoiu, Cornel Trailescu, Aurel Stroe, Doru Popovici e surgiram no país as óperas de Britten, Bartok, Janacek, Richard Strauss, Debussy, Ravel ou Falla.
Surgiram também nomes incontornáveis da execução musical, como o maestro Sergiu Celibidache e os pianistas Dinu Lipatti e Clara Haskil. No que diz respeito ao canto, surgiu uma plêiade absolutamente incontornável de intérpretes. Muitos deles apresentaram-se em São Carlos: Nicolae Herlea; Virginia Zeani; Ileana Cotrubas; Viorica Cortez; Eugenia Moldoveanu; Maria Slatinaru.
O tenor Vasile Moldoveanu, enfim, foi o intérprete de DesGrieux na ópera Manon Lescaut de Puccini levada à cena no nosso teatro na temporada de 1988/89, protagonizada por Mara Zampieri.