O Concerto de Câmara que se vai realizar no Salão Nobre a 25 de outubro com a O.S.P. sob a direção de Bruno Borralhinho, que também será solista em violoncelo, é quase um gesto operático!
Desculpar-se-me-á a exaltação, mas para mim a Noite é o espaço privilegiado, natural, preferido e inevitável daqueles heróis (os canoros!) que nos gritam há séculos aos ouvidos o desejo de que ela seja eterna. A Noite é para eles a libertação, o único espaço onde é possível a explosão total de tudo o que a claridade não permite.
O “attimo divino” que cantava o Otello verdiano! Recordemos , para além do mouro, e entre muitíssimos exemplos possíveis, Tristan und Isolde (“O sink hernieder, / Nacht der Liebe” — Desce Noite do Amor), Un ballo in maschera (“…e più non sorga il dì” — “…que o dia nunca mais surja”), Madama Butterfly (“Dolce notte! / Tutto estatico d’amor ride il ciel!” — “Doce noite, o céu ri extasiado de amor”).
Pois o programa que Bruno Borralhinho nos propõe é quase um paralelo instrumental deste pendor noctívago dos heróis de ópera, dado que teremos um concerto totalmente preenchido com peças absolutamente marcadas pela noite.
Começaremos com uma das mais amadas de Arnold Schönberg, (dir-se-ia mesmo mais populares, não se continuasse o autor a casar tão mal com este adjetivo): Vertklärte Nacht (Noite Transfigurada), baseada num poema de Richard Dehmel com o mesmo título que termina com o significativo verso “Zwei Menschen gehn durch hohe, helle Nacht” (“Duas pessoas caminham na alta e brilhante noite”). Este poema, em 5 estrofes, marcou a estrutura da obra musical, em 5 secções. Composta em 1899, nos finais do século XIX, Noite Transfigurada permanece como a mais importante obra da juventude de Schoenberg (é o seu opus 4). A versão original para sexteto de cordas sofreu um arranjo para orquestra de cordas em 1917 que foi estreado em Inglaterra na cidade de Newcaastle upon Tyne, em dezembro de 1924.Esta versão foi por sua vez revista em 1943.
Deslocar-nos-emos para Leste e recuaremos poucos anos para ouvirmos o Noturno para violoncelo e orquestra de cordas de Tchaikovski um arranjo do Noturno das Seis peças para violoncelo e piano, de fevereiro de 1873.
Finalmente, recuando ainda no tempo, regressaremos ao Centro da Europa para ouvirmos Uma Pequena Música Noturna / Eine kleine Nachtmusik, título que o próprio Mozart atribuíu à sua Serenata No. 13 para cordas em Sol maior, K. 525, escrita em 1787. O tema que se ouve a iniciar o primeiro andamento é um dos mais célebres de toda a música ocidental.