A nova produção da ópera Alceste, com encenação de Graham Vick e com Ana Quintans como intérprete do papel titular, constitui já um dos mais esperados títulos da presente temporada. Recorde-se que esta ópera de Gluck teve no São Carlos, ao longo dos 225 anos de existência do teatro, apenas duas representações: a 25 e a 27 de janeiro de 1957.
Intérprete do papel titular foi, então, Inge Borkh, cantora alemã que no nosso palco deixou memórias inolvidáveis e que morreu, com 97 anos, no passado dia 26 de agosto. Cumpre recordar um percurso que foi dos mais notáveis na segunda metade do século XX no que ao repertório de soprano dramático diz respeito.
Inge Borkh nasceu em Manheim, cidade com marcantes tradições e práticas musicais desde o século XVIII, a 26 de maio de 1921. O seu pai, diplomata e judeu, fugiu da Alemanha com a família em 1933, estabelecendo-se num primeiro período em Viena (onde Borkh teve oportunidade de trabalhar com o grande encenador Max Reinhardt) e após 1938 na Suíça. Borkh estreou-se, assim, em Lucerna em 1940. Espantosamente para uma futura intérprete de Elektras e Turandots, o primeiro papel foi o de Czipra na opereta O Barão Cigano de Johann Strauss. A cantora permaneceu na Suíça durante a II Guerra Mundial, apresentando-se em Basel, Lucerna e Zurique.
Foi na Suíça que Inge Borkh recebeu as primeiras atenções internacionais, antes de se tornar artista residente da Deutsche Oper de Berlim e da Ópera da Baviera, em Munique, a partir de 1952. Teve, assim, curiosamente, um percurso inicial algo semelhante ao de Montserrat Caballé, outra diva maior recentemente falecida, pois ambas basearam os inícios das respetivas carreiras na Suíça. Para sublinhar semelhanças, Caballé foi também intérprete em São Carlos de uma ópera de Gluck: a Ifigénia em Táurida (fevereiro de 1961).
Foi na Década de 50 que Inge Borkh se começou a apresentar triunfalmente nos Festivais de Bayreuth e de Salzburgo e nos principais teatros de ópera das Américas de da Europa como renomada intérprete de papéis como Salomé, Elektra, Turandot ou Leonore de Fidelio. Retirou-se de ópera em 1973 depois de cantar Elektra em Itália. Deixou várias gravações, uma das quais da ópera Iphigénie en Tauride de Gluck.
Cantou inúmeros papéis em São Carlos! Dá-se a lista dos títulos em que se apresentou, bem como os respectivos anos. Elencos e mais pormenores na Categoria MIL E UMA E MAIS NOITES.
1 e 3 de fevereiro de 1952: Der Fliegende Holländer (Richard Wagner) — Senta
21 e 28 de fevereiro de 1953: Salomé (Richard Strauss) — Salomé
26 de fevereiro de 1953: Der Fliegende Holländer (Richard Wagner) — Senta
2 de março de 1953 – Fidelio (Ludwig van Beethoven) — Leonore
12, 14 e 20 de fevereiro de 1954: Elektra (Richard Strauss) — Elektra
3 e 5 de fevereiro de 1956: Salomé (Richard Strauss) — Salomé
9 e 11 de fevereiro de 1956: Euryanthe (Carl Maria von Weber) — Eglantine
25 e 27 de janeiro de 1957: Alceste (Gluck) — Alceste
1 e 3 de fevereiro de 1957: em Fidelio (Beethoven) — Leonore
12 e 15 de março de 1959: Turandot (Puccini) — Turandot
1 e 3 de março de 1962: Arianne et Barbe-Bleue (Paul Dukas) – Arianne
21 e 23 de janeiro de 1972: Elektra (Richard Strauss) — Elektra