A recente apresentação da ópera Elektra de Richard Strauss traz-me à memória a figura do francês Patrice Chéreau (1944-2013) pois foi este o último título operático que ele encenou, no próprio ano em que morreu, marcando uma sua primeira – e derradeira – incursão no campo straussiano.
Patrice Chéreau apresentou-se em várias ocasiões em Portugal. Recordo, por exemplo, a enorme comoção de ter visto em cena no Teatro Nacional D. Maria II a sua encenação da peça A Dor de Marguerite Duras.
Patrice Chéreau esteve também no nosso teatro, em 2006, na dupla qualidade de intérprete e de encenador, protagonizando, num palco despido de cenários, uma leitura dramática de um dos capítulos do romance “Os Irmãos Karamazov” de Fiodor Dostoievsky – uma Narrativa feita por Ivan, irmão de Aliocha, que descreve o regresso de Cristo à Terra na Sevilha do século XVI. O espectáculo intitulava-se “A Lenda do Grande Inquisidor” e foi apresentado no âmbito do Ciclo Paisagens do Teatro Contemporâneo II. Tenho um enorme desgosto por não poder recordar esta sua única apresentação em São Carlos, mas afazeres profissionais na época mantiveram-me infelizmente afastado de Lisboa.
O palco de um teatro de ópera não era um local estranho para este actor, realizador cinematográfico e encenador, dado que Patrice Chéreau desde muito cedo na sua carreira se interessou pelo género lírico.
Logo no ano de 1969, com 25 anos apenas, encenou no Festival de Spoleto a ópera L’Italiana in Algeri de Rossini, iniciando risonhamente uma carreira que terminaria com os desesperos da Casa dos Átridas.
Dá-se em seguida a lista dos outros títulos operáticos encenados por Patrice Chéreau.
Em 1974 encenou para a Opéra de Paris Les contes d’Hoffmann de Offenbach, com Nicolai Gedda no papel principal.
1976 marcou a consagração planetária de Chéreau, pois cumpriu-se neste ano o centenário de O Anel do Nibelungo de Richard Wagner e o Festival de Bayreuth, por sugestão do maestro Pierre Boulez, convidou o encenador para apresentar a sua leitura dessa Tetralogia da máxima visibilidade – era o Jahrhundertring ! O Anel do Centenário! A visão radical de Chéreau causou um enorme escândalo, tendo sido recebida com manifestações de intenso desagrado na estreia. Contudo, teve um aplauso de 45 minutos aquando das últimas representações, ocorridas em 1980, ano em que a produção foi filmada para televisão.
Chereau a partir deste trabalho passou a aceitar apenas produções muito escolhidas.
A 24 de Fevereiro de 1979 houve a estreia absoluta na Opéra de Paris da versão em 3 actos – completada por Friedrich Cerha – da ópera Lulu de Alban Berg. Chéreau encenou, Pierre Boulez foi uma vez mais director musical e protagonista escolhida foi Teresa Stratas.
Chéreau encenou ainda a ópera Lucio Silla de Mozart em 1984 no seu Théâtre des Amandiers em Nanterre, uma produção que foi também apresentada no La Monnaie em Bruxelas e no Scala de Milão.
Mozart foi ainda o passaporte de entrada de Chéreau no Festival de Salzburgo, palco onde a sua leitura do Don Giovanni pôde ser vista de 1994 a 1996. Este compositor foi sem dúvida uma das mais constantes paixões teatrais de Chéreau, dado que, depois das experiências referidas, encenou ainda a ópera Così fan tutte, que foi aplaudida em 2005 e 2006 no Festival de Aix-en-Provence, na Opéra National de Paris e no Wiener Festwochen.
A ópera Wozzeck de Alban Berg foi vista de 1993 a 1999 nos palcos do Théâtre du Chatelet e da Staatsoper de Berlim sob a direcção musical de Daniel Barenboim, com Franz Grundheber no papel titular e Waltraud Meier no de Marie. Esta produção foi filmada em 1994.
A obra de Richard Wagner regressou à vida e à carreira de Patrice Chéreau em 2007, quando o Tristão e Isolda subiu à cena do Teatro alla Scala, também sob a direcção musical de Daniel Barenboim. Waltraud Meier passava aqui de Marie a Isolda. Chéreau confessou mais tarde que se tinha mantido afastado desta ópera wagneriana por a considerar mais musical do que teatral.
A ópera Da Casa dos Mortos de Janáček, que assinalou uma nova colaboração com Pierre Boulez, foi estreada no Festival de Viena em 2007 e depois levada ao Festival da Holanda, ao Festival de Aix-en-Provence, ao Met de Nova-Iorque em 2009 (assinalando a estreia de Chéreau neste teatro) e ao La Scala.
A última encenação de Patrice Chéreau foi a ópera Elektra de Richard Strauss. Sob a direcção musical de Esa-Pekka Salonen, este derradeiro trabalho do encenador no campo da ópera foi estreado no Festival de Aix-en-Provence em Julho de 2013. Os cenários eram do seu colaborador em inúmeras empolgantes aventuras teatrais – Richard Peduzzi.
Patrice Chéreau morreu em Paris a 7 de Outubro de 2013 com 68 anos de idade.