São Carlos recordou um dos seus

São Carlos recordou um dos seus

O Salão Nobre acolheu ontem, dia 17 de outubro, um Concerto destinado a assinalar o lançamento do primeiro registo em CD de música instrumental solística de Francisco António Norberto dos Santos Pinto, compositor, cantor, trompista, também violinista, que foi figura de relevo no séc. XIX português.

Como intérpretes apresentaram-se, como solistas, Nuno Pinto, Steven Mason, Luís Vieira, Paulo Guerreiro, Carolino Carreira, João Paulo Santos, (alguns deles instrumentistas da OSP, portanto) e a Banda Sinfónica da Polícia de Segurança Pública. A direção esteve a cargo do Comissário José Manuel Ferreira Brito.

Francisco António Norberto dos Santos Pinto nasceu a 6 de junho de 1815 em Lisboa e começou a carreira desde tenra idade quando a sua voz de soprano começou a ser admirada em festas religiosas. Ele deixar-nos-ia uma extensa obra religiosa, escrita durante toda a sua vida, na qual figura um Te Deum oferecido a el-rei D. Fernando. Terminada a aventura canora, devido à mudança da voz, embarcou depois numa carreira de concertista que foi algo breve, pois durou apenas até 1843. Dedicou-se, a partir de então, à atividade de compositor.

Ele interessa-nos sobretudo por ter integrado como instrumentista a orquestra do Real Teatro de São Carlos e por ter sido em 1857 nomeado maestro director da casa, cargo que ocupou durante um período curto. Curiosamente, nunca escreveu uma ópera para o nosso palco.

Depois da execução da primeira peça (Rêverie pour le Basson sobre a Canzonetta Il Rimprovero de Rossini, de 1856, interpretada por Carolino Carreira e por João Paulo Santos), falaram a Professora Luísa Cymbron e o Professor Rui Magno Pinto. Este último sublinhou que o concerto representava uma certa continuidade, dado que antepassada da Banda da PSP foi a Banda da Guarda Real da Polícia, que Francisco António Norberto dos Santos Pinto integrou como trompista quando era ainda um adolescente de 15 anos. Outro fator de continuidade óbvio, dado que Santos Pinto integrou a orquestra do RTSC e foi aqui diretor, foi o concerto ter decorrido no Salão Nobre do teatro com alguns instrumentistas da OSP.

O nosso compositor, porém, afirmou‑se no meio musical português fora do São Carlos. O Teatro D. Maria II foi também um dos seus principais palcos de atividade, tendo ele inclusivamente escrito a Ode-Cantata A manhã de um belo dia para solenizar a inauguração do edifício, a 29 de outubro de 1845. Para o teatro ele escreveria, aliás, um vastíssimo corpus musical (onde constam dezanove bailados!) destinado a preencher musicalmente dezenas de dramas, comédias e farsas destinadas aos palcos do D. Maria e do Teatro da Rua dos Condes.

O compositor esteve ainda diretamente ligado à fundação em 1845 da Academia Melpomenense (sediada no local onde hoje se erguem os Armazens do Chiado) e à Associação Música 24 de Junho. Para estas duas últimas instituições escreveu numeroso conjunto de obras destinadas a serem interpretadas pelos mais capacitados instrumentistas portugueses da época, muitos deles seus amigos. Escreveu também inúmeros artigos sobre música para a Revista dos Espectáculos e uma série sobre a História da Música para um jornal intitulado Rigoletto. A obra de Francisco António Norberto dos Santos Pinto é muito marcada pela linguagem e estética italiana então em voga.

Na primeira edição (1939) do livro Quadros Históricos da Vida Musical Portuguesa o autor, Manuel Ribeiro, elogia em Francisco António Norberto Dos Santos Pinto “o talento e a grande qualidade de carácter, que para quantos o conheceram se tornou objecto de especial veneração”. Mais à frente diz que “a sua variedade de estilo é considerável, elevando-o à honra de ser colaborador de Castilho”. Francisco António Norberto dos Santos Pinto morreu novo, com 45 anos, tendo falecido no dia 30 de janeiro de 1860. A sua passagem por São Carlos não está muito esmiuçada. Temos porém notícia de que a 18 e a 20 de maio de 1840 foi executada, entre outras obras, a sua Abertura para duas orquestras (nessas noites foi também cantada a ópera Caterina di Clevis de Luigi Savi com um elenco que integrava Felice Varesi, o criador mundial de Rigoletto!).

Nesta homenagem que lhe foi prestada no Salão Nobre foram executadas: Piquena Pessa Militar “A Camponêza na Sésta” para clarinete solo e Banda , de 1834, com Nuno Pinto; Variações para Corneta d’Xaves com acompanhamento de Banda Marcial, de 1834, com Stephen Mason; Solo Concertante para duas trompas em Fá e Banda, sem data, com Paulo Guerreiro e Luís Vieira; finalmente, a Fantasia para fagote sobre motivos da ópera Roberto Devereux com acompanhamento de Banda, obra de 1847. Esta última peça lançou-me violentamente para trás no tempo quando ouvi o meu colega e amigo Carolino Carreira tocar no fagote a belíssima frase “Se amor ti guida” desta ópera que ouvi em São Carlos em 1986 cantada por Mara Zampieri.

Continuidades…

Francisco Antonio Norberto dos Santos

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