Sendo La Traviata o próximo título operático da nossa temporada, importa clarificar uma turva perceção que se instalou em Lisboa segundo a qual na célebre edição de 1958 desta ópera em São Carlos o tenor Alfredo Kraus (o Alfredo Germont) era um estreante praticamente desconhecido que se defrontava com a já experiente, madura, rodada, intocável e divina Callas. Importa esclarecer que nem Kraus era tão jovem e inexperiente, nem Callas tão afastada etariamente dele como a turva perceção nos quis fazer acreditar.
Comecemos precisamente pelas idades. Em 1958 Alfredo Kraus, nascido em 1927, tinha 31 anos, nada, portanto, do “imberbe” que muitos nos quiseram fazer acreditar que seria! Callas, nascida em 1923, tinha 35 anos. Eram, portanto, da mesmíssima geração!
Quanto à “inexperiência” de Kraus: como se poderá falar assim de um tenor que já tinha atuado durante anos em palcos de zarzuela, cantado ópera em Londres, no Cairo e em Turim e que um ano antes se tinha apresentado precisamente no papel de Alfredo no La Fenice de Veneza ao lado de Renata Scotto?
Esta faz-me lembrar uma história passada no Castelo de Blois, na região do Loire, Ali vi um quadro cuja legenda era “O Assassinato do Velho Duque de Guise”. Referia-se ao assassinato de Henri de Lorraine, duque de Guise, perpetrado naquele Palácio a 12 de Dezembro de 1588 por ordem de Henrique III. Pois O “velho duque”, nascido em 1550, contava … 38 anos! Pouco mais do que a “velha” Callas que cantou a Violetta em Lisboa!