Please no more War!

Please no more War!

A Catedral de São Miguel em Coventry, destruída no decorrer da II Guerra Mundial, teve a sua Consagração, depois de reconstruída, em Maio de 1962. Para celebrar a data foi encomendado o “War Requiem” a Benjamin Bitten. Esta obra foi executado nos inícios de Maio pela Orquestra Sinfónica Portuguesa e pelo Coro do Teatro Nacional de São Carlos num concerto integrado na Temporada Gulbenkian de Música.

Coloquei ao maestro do evento, Graeme Jenkins, que na temporada passada já nos dera em São Carlos, com a ópera “Peter Grimes, uma poderosa leitura de Britten, uma única questão. Das centenas de “Requiem” escritos ao longo da história da música, apenas um escasso número continua a ser regularmente ouvido – Mozart, Verdi, Brahms, Dvorak, Fauré, Britten… Porque pertencerá o “War Requiem” a este conjunto de “eleitos”?


“Estamos a cem anos do fim da I Grande Guerra e a recordar o que aconteceu nesses campos de batalha de há um século. Isto é já uma diferença.

É terrível pensar que quando os sinos tocavam em Inglaterra no dia 11 de Novembro de 1918 em grande celebração, tal como seguramente aconteceu em Portugal (finalmente, depois de 4 anos, tudo estava acabado!), a porta de casa dos pais de Wilfred Owen tocou e um sargento do exército entregou-lhes um telegrama a informar que o filho tinha morrido no dia 4 de Novembro, uma semana antes do fim do conflito.

A poesia de Owen, que era pouco conhecida na Inglaterra de 1961, é verdadeiramente o coração da obra de Britten. Recorde-se que antes de “Peter Grimes” o compositor e Peter Pears partiram para a América para evitar a guerra em Inglaterra. Depois decidiram regressar e “Peter Grimes” estreou em 1945 no Sadler’s Wells. Criou-se uma enorme tensão entre o coro e a orquestra, por um lado, e Britten e Pears, por outro – não apenas devido ao facto de ambos serem homossexuais, mas também porque ambos não tinham servido durante a guerra. Porque é que eles estavam a fazer esta peça intitulada “Peter Grimes”? Britten sempre tentou colocar as nações a dialogarem entre si e sempre celebrou a paz. Quando a estreia do “War Requiem” se deu, ele queria para solistas Galina Vishnevskaya, o famoso soprano russo, um tenor inglês e o famoso barítono Dietrich Fischer-Dieskau. Todas as nações beligerantes juntas e finalmente em paz! Infelizmente, as autoridades soviéticas não autorizaram Vishnevskaya a estar presente, mas foi ela a gravar depois a obra. Aí, e só aí, todos tomaram consciência do poder da poesia de Wilfred Owen.

O último poema que se ouve no “Dies irae” intitula-se “Silent Meeting” e foi escrito em finais de 1917. Wilfred Owen, que ainda nada tinha publicado, conheceu no hospital onde estava em recuperação outro poeta inglês chamado Siegfried Sassoon. Juntos escreveram este inacreditavelmente belo poema em que um alemão morto encontra um morto inglês e lhe diz “Tu és o inimigo que eu matei, meu amigo”. E depois silêncio, enquanto os dois mortos olham um para o outro. Na estreia, Dietrich Fischer-Dieskau, que tinha lutado na guerra, recordou todos os seus amigos que morreram e teve uma enorme comoção. Eu tenho a sorte de pertencer a uma geração que nunca foi à guerra, mas li História o suficiente e sei o suficiente para perceber como, na I Grande Guerra, ceifaram os filhos às famílias.

A conhecida cena de Abrãao e de Isaac, em que o Anjo faz com que Abrãao mate um cordeiro, em vez do filho. Aqui não! O velho mata o filho e depois surgem as palavras “e metade dos descendentes da Europa, um por um (“and half the seed of Europe, one by one”), como se uma metralhadora varresse todos aqueles jovens homens.

Já dirigi muitas vezes este Requiem e considero-o muito complexo de traduzir porque, seja qual for o nosso Credo, acreditemos ou não em Deus, sabemos o que é a guerra e sabemos o que ela provoca. Esta obra, no final, dá-nos uma grande esperança para o futuro: “Please, no more war!”

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