Ópera é vida! — Marco Alves dos Santos

Marco Alves dos Santos, o Arbace na nossa produção de Idomeneo, re di Creta, falou-nos da sua relação com a obra de Mozart, entre outras coisas.

 

MOZART — COMO O SENTE COMO SER HUMANO E COMO ARTISTA

Mozart estará para a Música como Einstein para a Física, por exemplo. Ele é de facto um génio e devemos estar gratos por ter tido neste mundo uma ser com essa capacidade de transformar temas e ideias tão simples, que por vezes nos parecem tão básicos, em música tão engrandecedora para a Humanidade. Devemos ter honra em cantá-lo.

Quando olhamos para Mozart do ponto de vista humano olhamos de facto para o Iluminismo. Mozart é a personificação do Iluminismo.

É difícil dissociar-me do facto de ser músico e cantor. Mozart é referência que todos devemos ter — e para todo o canto! Nas audições quer-se sempre ouvir Mozart porque é difícil fugir-lhe, é difícil com ele ter artifícios técnicos ou vocais. Mozart apresenta um canto sem filtros, onde não há recurso a artifícios ou a truques — ou se tem, ou se não tem; ou tens técnica ou não chegas ao fim. Esta é outra dificuldade — e aqui não falo propriamente do Arbace: para cantarmos o Idomeneo, ou o Ferrando de Così fan tutte, que eu já fiz, é necessário estarmos em palco o tempo todo.

A música desse período dá-nos também a possibilidade de cantar árias e recitativos, o que representa duas técnicas completamente diferentes. É muito recompensador e gratificante cantar Mozart.

 

E ÓPERA É …

Vida!

O que é que nós fazemos quando cantamos ópera? Vendemos sentimentos e emoções às outras pessoas. Sei que isto é um pouco cruel de dizer, mas é o que sinto — e nem é sequer uma criação da minha cabeça, foi algo que me foi dito por um encenador durante o meu percurso académico. Numa sociedade que tende a ser completamente desprovida de sentimentos, em que nos sentamos a jantar enquanto passam por nós na televisão imagens das maiores desgraças da Humanidade, a ópera dá-nos de novo a faculdade de sermos humanos. Estamos em palco e damos a outras pessoas (que pagaram bilhete) a possibilidade de sentirem qualquer coisa. É isso que a ópera nos dá — vida! A ópera é vida! No fundo é isso que nós fazemos — damos vida à sociedade. Com todas as coisas boas e más da vida — personagens bons, personagens maus, histórias horríveis, comédias, dramas. É isso! Isso é a vida, é a própria natureza humana, a dualidade dela e a sua imperfeição. É isso a ópera!

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