Lisboa agradou ao casal Gigliucci!: “Admirable godsend”; cozinha excelente; confortável hospedagem num antigo convento; a simpatia dos portugueses.
O testemunho de Clara Novello, registado em várias cartas que enviou do nosso país, é precioso para tomarmos consciência do que era um teatro de ópera em meados do século XIX.
Numa carta, escrita em inglês, Clara Novello descreve o que foi a sua Noite de Benefício (noites em que a receita, ou parte dela, revertiam a favor do Beneficiado) em São Carlos. É um documento único que nos permite compreender o que era o entusiasmo dessas noites.
Minha querida Bianca,
A tua carta deu-me um enorme prazer. Tinha decidido responder-te a 27 de Março (dia de Santa Madalena), mas estive muito ocupada durante todo o dia a receber visitas, etc., etc., pois a 26 foi o dia do meu Benefício. Foi uma noite brilhante, embora muito fatigante, pois cantei I Puritani (bisei a Polacca, como fiz em todas as noites) e a Cavatina de Norma. Mas o que mais me cansou foram os intermináveis agradecimentos, o ter de atravessar o palco e recolher flores, coroas, pássaros engalanados com flores, pombas, etc., etc. Entre outras ofertas, quatro coroas de flores francesas artificiais que estavam maravilhosamente atadas com valiosas faixas e alguns enormes caixilhos – um com as nossas três cores italianas; outro bordado a ouro, com o meu nome, a data e a inscrição “Un serto offerto al merito”; outro a ouro e prata oferecido por uma Lady que dizia em português (como podes ver) “Ao mérito e à virtude”. Entre as aves havia um pequeno pássaro brasileiro de grande valor. O Benefício rendeu-me 2843 francos em dinheiro.
Em casa recebi ainda um lindo leque, lenços, um maravilhoso vestido de seda com folhos e bordados no corpete, notas de banco e flores, oh! flores! Tantas, que tive de arranjar outro quarto para as colocar. No Teatro tive de as colocar noutro camarim, pois no meu era uma contínua passagem para apreciar as coisas lindas que recebi e a bela decoração.
Tudo no mundo tem os seus contras e aqui os empresários são um pouco mais vigaristas do que é habitual — mas até se torna lisongeiro o facto de me quererem fazer trabalhar demais.
Tenho sido muito feliz em Lisboa.”